28 de fev. de 2012

Conferência em Londres discute futuro da Somália : como assim???

Enquanto representantes das potências ocidentais debatem a situação no país africano, manifestante protestam contra uma possível intervenção militar estrangeira

24/02/2012

J. R. Penteado,
de Londres


Representantes de mais de 40 países do mundo compareceram na quinta-feira (23), em Londres, a uma conferência convocada para tratar sobre o futuro da Somália, país que se arrasta em um conflito interno armado há mais de duas décadas. O primeiro-ministro britânico David Cameron abriu o encontro, que contou também com a presença da Secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, e com o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon.

De acordo com o jornal britânico The Guardian, o governo do Reino Unido e os de outros países europeus estariam considerando a hipótese de realizar ataques a alguns pontos estratégicos do país africano, visando campos de treinamento de grupos islâmicos insurgentes e de piratas somalis. Segundo Cameron, “a Somália é um estado falido que ameaça diretamente os interesses britânicos.”

O primeiro-ministro do Reino Unido recentemente manifestou preocupação com o grupo islâmico al-Shabaab, filiado à Al-Qaeda, e que vem travando batalhas contra as forças militares da União Africana na Somália. Mais de 200 estrangeiros estiveram em campos de treinamento do grupo nos últimos 6 anos, sendo 40 deles britânicos.

O encontro ocorre em um momento que o governo transitório somali, que tem sobrevivido graças à presença das forças militares externas, deve deixar o poder em agosto. Ainda segundo o jornal The Guardian, um rascunho de um comunicado oficial, que veio a público após um vazamento, afirma que o governo transitório atual será substituído por uma nova autoridade, que deverá se manter em cargo até que uma nova constituição seja elaborada e aprovada, e até que novas eleições ocorram.

Foto: J. R. Penteado

Do lado de fora do prédio da conferência, cerca de 50 pessoas, em sua maioria somalis, protestavam contra a possível intervenção estrangeira no país. Para Duale Yousof, membro da organização “Voice 4 Somalia”, o principal motivo do súbito interesse do Ocidente em agir no país africano tem a ver com petróleo. “Foram descobertas jazidas de petróleo na Somália recentemente. Esse é o grande motivo das forças do Ocidente estarem dispostas a invadir nosso país agora.”

Em janeiro, a BBC noticiou que a petroleira canadense Africa Oil começou a exploração de uma área na Somália que pode conter 4 bilhões de barris de petróleo em reserva.

Sobre a questão da pirataria, ele acrescenta: “Por anos, grandes navios pesqueiros estrangeiros foram à nossa costa e praticaram pesca predatória, além da grande quantidade de lixo tóxico despejado na região. Isso tudo acabou com todos os nossos peixes, deixando os pescadores locais sem nada. A pirataria é sim um problema, mas também é reflexo dessas ações praticadas pelo Ocidente.”

Diversas mulheres também participaram do protesto, empunhando cartazes que clamavam pelos direitos das mulheres na Somália. Muna Hassam, de Somalilândia, região autônoma do país, fez acusações contra o governo transitório. “O governo atual diz que as mulheres estão seguras, mas é mentira. As mulheres somalis são constantemente vítimas de estupro em meio ao conflito armado instalado.”

Para Hassam, a conferência seria apenas uma fachada para uma futura intervenção na Somália. “Eles já decidiram tudo. O que está acontecendo aí é uma mera formalidade. Eles querem dividir o país para servir aos seus próprios interesses.”

Já Abdi Aakhiro, membro da organização Fight for Somalia, critica diretamente o primeiro-ministro do Reino Unido. “David Cameron disse que a Somália é um Estado falido, mas isso não é verdade. Nós podemos governar nosso país, nós podemos tomar conta de nós mesmos.” E ainda acrescenta. “Somos totalmente contra essa guerra terceirizada que os governos norte-americano e britânico querem implementar, ao financiar os exércitos do Quênia, Etiópia e de Uganda para invadir nosso país.”

Em 2006, forças da Etiópia patrocinadas pelo Ocidente entraram na Somália para expulsar da capital Mogadíscio as forças do então governo islâmico da União de Cortes Islâmicas.

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