quis ser poeta
virei escriba
Manoel de Barros.
Aqui a palavra desencontra as fórmulas e as firulas:
O sentido normal das palavras não faz bem ao poema.
Há que se dar um gosto incasto aos termos
Haver com eles um relacionamento voluptuoso.
Talvez corrompê-los até a quimera.
Escurecer as relações entre os termos em vez de aclará-los.
Não existir mais rei nem regências.
Uma certa liberdade com a luxúria convém. (o guardado de águas - 63)
Passado o susto. Vem outro:
Não pode haver ausência de boca nas palavras: nenhuma fique desamparada do ser que a revelou. (livro sobre nada - 67)
E quando nos apaixonamos e corremos a solicitar direito de posse, Manoel escorrega e avisa:
O poema é antes de tudo um inutensílio.
Hora de iniciar algum
Convém se vestir roupa de trapo.
Há quem se jogue debaixo do carro
Nos primeiros instantes.
Fez bem uma janela aberta
Uma veia aberta.
Pra mim é uma coisa que serve de nada o poema
Enquanto vida houver.
Ninguém é pai de um poema sem morrer (Arranjos para assobio - 25)
Poesia não tem dono. Nem prumo. Num rumo. É inutensílio.
Mas tudo se esclarece logo. É que:
Minhocas arejam a terra; poetas, a linguagem. (livro de pré-coisas -59)
Simples assim.
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